Intestino e metabolismo do triptofano

Os rápidos avanços nas tecnologias ômicas e bioinformática uniram forças para decifrar sistematicamente a função do microbioma intestinal. O microbioma intestinal é uma comunidade de microrganismos metabolicamente ativos que habitam todos os nichos ao longo dos intestinos e que coevoluem com seu hospedeiro.

A metagenômica e a metabolômica levaram à descoberta de milhares de pequenas moléculas derivadas de micróbios, bem como os genes associados às suas produções. Os modelos metabólicos em escala genômica (GEMs) visam capturar com precisão o metabolismo de um organismo integrando informações obtidas de anotação genômica, reação bioquímica, curadoria manual e revisão de literatura. GEMs de alta qualidade estão agora disponíveis para vários microrganismos e servem como bons recursos para investigações em larga escala do metabolismo microbiano do triptofano.

As vias do metabolismo do triptofano podem ser extraídas dos GEMs para ajudar a entender a distribuição do metabolismo do triptofano no microbioma intestinal. Sabemos hoje que perturbações na composição do microbioma, denominadas disbiose, estão implicadas em alterações no metabolismo do triptofano e no aumento do risco de várias doenças, incluindo as gastrointestinais, infecciosas, metabólicas, além de distúrbios neurológicos.

A disbiose intestinal leva a uma mudança na produção de vários metabólitos microbianos que então influenciam a fisiologia e o estado imunológico do hospedeiro. Entre esses metabólitos bioativos, os ácidos graxos de cadeia curta (AGCCs, produzidos por bactérias a partir da fermentação de fibras alimentares), ácidos biliares secundários (originados no fígado e transformados pelo microbioma intestinal) e metabólitos derivados do triptofano são os mais conhecidos.

Definimos a via do metabolismo do triptofano como um conjunto de reações que transferem o triptofano para um produto final. O metabolismo do triptofano gera 29 metabólitos bioativos por meio de três vias principais — via do indol, via da serotonina e via da quinurenina.

A via do indol, convertendo o triptofano em derivados do indol, incluindo ligantes AhR, predomina em micróbios intestinais, enquanto as vias da serotonina e da quinurenina predominam em hospedeiros mamíferos.

A maioria dos artigos científicos descreve os papéis indiretos do microbioma intestinal na modulação da produção de quinurenina e serotonina por meio de metabólitos não triptofanos, como o butirato, um importante AGCC derivado de micróbios intestinais. Mas, há produção direta de quinureninas e serotonina por micróbios intestinais, como Lactococcus lactis, Lactobacillus plantarum e Klebsiella pneumoniae, que produzem serotonina de forma semelhante ao hospedeiro mamífero por meio da descarboxilase de aminoácidos aromáticos (AAAD).

Outro neurotransmissor importante, a triptamina, é produzido por Clostridium, Ruminococcus, Blautia e Lactobacillus por meio de descarboxilases de triptofano. Além disso, alguns micróbios intestinais podem degradar o triptofano de uma maneira diferente através da via da quinurenina.

Por exemplo, foi relatado que a espécie intestinal Burkholderia cepacia converte o triptofano em 2-amino-3-carboximuconato semialdeído, que é posteriormente degradado enzimaticamente em piruvato e acetato através dos intermediários 2-aminomuconato e 4-oxalocrotonato em vez da via conhecida de mamíferos que transforma 2-aminomuconato em 2-cetoadipato e, finalmente, glutaril-coenzima.

Entender os diálogos moleculares entre o microbioma intestinal e o hospedeiro é essencial para desenvolver abordagens diagnósticas e terapêuticas baseadas no microbioma. Por exemplo, determinadas bactérias podem degradar o triptofano em uma variedade de indóis, incluindo indol-lactato (ILA), ácido indolacético (IAA), indolealdeído (IAld), ácido indolacrílico (IA) e indolepropionato (IPA).

Indóis ativar o receptor de hidrocarboneto arila (AhR), um fator de transcrição amplamente expresso pelas células do sistema imunológico, regular a homeostase intestinal, iniciar uma resposta imunológica e controlar a defesa contra o estresse oxidativo. A ativação do AhR está associada a várias doenças, como doença inflamatória intestinal (DII), diabetes tipo 2 e distúrbios relacionados ao sistema nervoso central (SNC).

Fontes de triptofano na alimentação

O triptofano é um aminoácido encontrado em muitos alimentos como bananas, semente de abóbora, soja, grão-de-bico, tâmaras secas, amendoins, leite, carne, peixe, peru e alimentos ricos em proteínas. Além disso, muitas pessoas suplementam triptofano para aumento da síntese de serotonina e melhoria do humor ou tratamento da depressão leve. Contudo, conforme visto, o triptofano pode ser desviado para o metabolismo dos indóis e gerar problemas. Assim, antes de suplementar triptofano é importante a modulação da disbiose intestinal.

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/