Obesidade, disbiose e alterações no neurodesenvolvimento

A obesidade materna, caracterizada por inflamação crônica de baixo grau e disbiose intestinal, pode comprometer o ambiente intrauterino — o chamado "inflamed womb" (útero inflamado)— e aumentar o risco de distúrbios do neurodesenvolvimento na prole, como TEA, TDAH, ansiedade e déficits cognitivos (Cirulli et al., 2022).

A obesidade gera um estado inflamatório crônico, com secreção aumentada de citocinas pró-inflamatórias como IL‑6, TNF‑α e IL‑1β, e ativação de sistemas imunitários via receptores TLR.

Durante a gestação, essa inflamação persistente prejudica a tolerância imunitária placentária, favorecendo um ambiente mais protetor à proliferação de células decíduas ativas e marcadores inflamatórios na placenta e líquido amniótico.

A obesidade também está associada à disbiose intestinal materna, com menos diversidade microbiana e aumento relativo de Proteobacteria (como E. coli) e diminuição de Bifidobacterium e Bacteroides fragilis.

Isso favorece permeabilidade intestinal aumentada (leaky gut), facilitando a passagem de endotoxinas (como LPS) e bactérias ou seus fragmentos via placenta, iniciando inflamação fetal e ativação TLR no sistema imune do feto.

Microglia Fetal como Alvo Prioritário

A microglia, macrófagos residentes do cérebro fetal, é fundamental na maturação, sinaptogênese, poda sináptica e plasticidade neural. É o sistema imune do cérebro.

Estudos em linhagens de animais germ-free (livres de microbiota) demonstram que a ausência de microbioma materno leva a microglia imatura e disfuncional, com expressão gênica alterada, de forma dependente de sexo.

Em modelos animais de obesidade materna, observa-se microglia hiperativa, níveis elevados de TLR4/IL‑1β e redução de fatores neurotróficos como BDNF e TPH2 (enzima chave da serotonina), resultando em interações regionais prejudicadas (hipocampo, córtex pré‑frontal, etc.) e déficits cognitivos, sociais e de regulação comportamental.

Evidência em Humanos e Meta-Análises

Análises epidemiológicas em milhões de nascimentos mostram associação consistente entre obesidade pré‑gestacional e:

  • Dobro do risco de TEA;

  • ~ 32% maior risco de TDAH;

  • Maior risco para transtornos de conduta e problemas comportamentais

  • Estudos longitudinais como PREOBE mostram que filhos de mães obesas apresentam pontuações elevadas em escalas comportamentais (CBCL) aos 3‑4 anos e maior incidência de problemas emocionais e de desenvolvimento.

Estratégias Nutricionais de Intervenção

Estudos mostram potenciais intervenções nutricionais com evidência emergente:

  1. N-acetilcisteína (NAC) – age como antioxidante e modulador da inflamação.

  2. MFGM (membrana de gordura do leite materno) – com compostos bioativos que influenciam a microbiota materna e fetal.

  3. LC-PUFA (ácidos graxos poli-insaturados de cadeia longa, especialmente ômega‑3) – regulam o perfil lipídico neurotrófico, reduzem inflamação e modulam microglia.

Esses nutrientes mostraram potencial em modelos animais para reduzir ganho de peso gestacional excessivo, estresse oxidativo e inflamação sistêmica, além de favorecer uma microbiota mais equilibrada.

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Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/