Filosofia da Alimentação (parte 2): o que Kant tem a ver com o que colocamos no prato?

Depois de explorarmos ontem o Utilitarismo, que dize que uma ação é certa se gera o maior bem possível, agora mergulhamos numa visão bem diferente: a ética kantiana, que coloca o foco não nas consequências, mas nos princípios morais que guiam nossas ações. E o que isso tem a ver com comida? Mais do que você imagina.

Kant: princípios antes das consequências

Immanuel Kant, um filósofo alemão do século XVIII, dizia que seres humanos devem ser tratados como fins em si mesmos, ou seja, com respeito pela sua dignidade, e nunca apenas como um meio para alcançar algo. Isso é o coração da sua teoria ética.

Quando olhamos para os animais, no entanto, Kant faz uma distinção: como eles não têm razão nem linguagem complexa, não temos deveres morais diretos com eles. O que temos são deveres indiretos — ou seja, não devemos maltratar animais porque isso pode nos tornar pessoas insensíveis, e isso prejudica como tratamos outros seres humanos.

Carol J. Adams: o elo entre animais e mulheres

A crítica feminista Carol J. Adams vai além. Para ela, existe uma conexão forte (e perigosa) entre o tratamento cruel dos animais e a objetificação das mulheres. Quando nos acostumamos a ver animais como objetos de consumo, ficamos mais propensos a tratar mulheres da mesma forma — como corpos disponíveis, descartáveis, sem voz. A cultura da carne, segundo Adams, normaliza a violência e o silenciamento, tanto de animais quanto de mulheres.

E se os animais forem mais éticos do que pensamos?

Do outro lado dessa conversa, cientistas como Frans de Waal e Jonathan Balcombe desafiam a visão tradicional kantiana. Eles trazem exemplos fascinantes do reino animal: chimpanzés que consolam seus pares, ratos que ajudam outros em sofrimento, golfinhos que parecem demonstrar empatia.

Esses comportamentos, segundo eles, mostram que muitos animais não são apenas seres instintivos, mas capazes de emoções complexas, empatia e até escolhas morais rudimentares. Ou seja, talvez eles mereçam muito mais do que um “dever indireto”. Talvez seja hora de reconhecer que eles têm valor moral por si mesmos.

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/