Produtos bacterianos de triptofano

A interação entre hospedeiro e microrganismos intestinais afeta amplamente o estado imunológico e metabólico do nosso corpo. A microbiota intestinal produz indol e seus derivados a partir do metabolismo do aminoácido triptofano (Trp). Estas moléculas interagem com o hospedeiro e exercem uma variedade de efeitos biológicos locais e heterotópicos circulando no plasma.

O triptofano é um aminoácido aromático essencial que não pode ser sintetizado em nosso organismo. Carnes de todos os tipos, ovos, laticínios, castanhas, amendoim, ervilha, abacate são exemplos de alimentos fonte de Trp. Este aminoácido será utilizado para sintetizar proteínas e o restante é metabolizado por células hospedeiras endógenas (via da quinurenina e via da serotonina) ou por microorganismos intestinais (via do indol e seus derivados). Existem três vias principais no metabolismo de Trp derivado de microorganismos intestinais: a via Trp-Indole, a via Trp-IPyA-ILA-IA-IPA e a via Trp-IAA-Skatole ou IAld.

IPyA, indole-3-piruvato; ILA, indole-3-lactato; IA, indole-3-acrilato; IPA, indole-3-propionato; IAAld, indole-3-acetaldeído; IAA, indol-3-acetato; IAld, indole-3-aldeído; IAM, indole-3-acetamina; IEA, indole-3-etanol; gene TnaA, codifica triptofanase; gene iaaM, codifica triptofano 2-monoxigenase; gene iaaH, codifica a hidrolase de indole-3-acetamida; Gene TrpD: codifica a enzima triptofano descarboxilase; gene ArAT, codifica aminoácido aromático aminotransferase; gene fldH, codifica a fenillactato desidrogenase; gene fldBC, codifica (R)-fenillactil-CoA desidratase alfa e subunidades beta; gene acdA, codifica acil-CoA desidrogenase; gene ipdC, codifica Indole-3-piruvato descarboxilase. (Li et al., 2021)

A microbiota converte Trp em indol e seus derivados como moléculas sinalizadoras para regular a integridade epitelial, a resposta imune e a motilidade gastrointestinal através de receptores intestinais. Estes compostos caem na circulação e chegam ao fígado para regular a inflamação e o metabolismo da glicose e lipídios.

IPA, indole-3-propionato; IAA, indol-3-acetato; ILA, indole-3-lactato; IAld, indole-3-aldeído; AhR, receptor de hidrocarboneto aromático; PXR, receptor de pregnano X; receptores 5-HT4R, 5-HT4; GLP-1, peptídeo 1 semelhante a glucagon; TLR4, receptor toll-like 4. (Li et al., 2021).

GUIA DE SUPLEMENTAÇÃO SIBO E IMO

Trp → Caminho do Indole (via Trp-Indole)

Mais de 85 espécies gram-positivas e gram-negativas de bacatérias são conhecidas por hidrolisar Trp em indol pela triptofanase. A concentração fecal de indol foi relatada em uma ampla faixa (de 0,30 a 6,64 milimoles em adultos saudáveis), o que indica que existem diferenças individuais muito grandes no metabolismo do indol. A concentração de indol vai depender da quantidade de Trp vindo da alimentação e da presença de bactérias como E. coli.

O indol pode ser convertido no fígado em indoxil e depois em indican (sulfatação para permitir excreção urinária) ou indigo. O indican (indoxil sulfato) é um produto de putrefação resultante da desconjugação bacteriana do triptofano dietético em indol no intestino delgado. Os níveis de Indican estão diretamente associados à atividade bacteriana nos intestinos. Níveis elevados indicam toxemia intestinal ou supercrescimento de bactérias anaeróbicas, putrefação de alimentos não digeridos nos intestinos, distúrbios estomacais (constipação, má absorção), distúrbios intestinais e insuficiência pancreática.

Indican urinário aumentado indica supercrescimento bacteriano. É comum, por exemplo, na doença celíaca e na SIBO (Ma, Zhang, & Qu, 2018)

Trp → Via da Triptamina

A triptamina é uma monoamina derivada do triptofano. Dois microrganismos comensais conhecidos, Ruminococcus gnavus e Clostridium sporogenes, convertem Trp em triptamina pela ação da enzima Trp descarboxilase (TrpD). Em indivíduos saudáveis, a presença de homólogos de TrpD é de pelo menos 10% de acordo com a análise das amostras do NIH Human Microbiome Project (HMP), o que indica que a produção de triptamina pela microbiota intestinal pode ser prevalente em humanos.

Trp→Indole-3-Piruvato→Indole-3-Lactato→Indole-3-Acrilato→Viagem de Indole-3-Propionato

IPyA (indole-3-piruvato) é convertido a partir de Trp pela presença do aminoácido aromático aminotransferase (ArAT). O IPyA é um precursor do ILA (indol-3-lactato), e a fenillactato desidrogenase (fldH) está envolvida nessa reação de redução. Através da desidratação, espécies bacterianas contendo fenillactato desidratase (fldBC) convertem ILA em IA (indole-3-acrilato). O IA pode ser ainda convertido em IPA (indole 3-proprionato) pela acil-CoA desidrogenase (AcdA), que é o produto final do metabolismo redutivo de Trp.

Recentemente, alguns pesquisadores descobriram que o IPA foi o metabólito mais significativa e consistentemente relacionado à ingestão de fibras e inversamente associado ao risco de diabetes tipo 2. O mecanismo associado pode ser parcialmente explicado pela variação funcional do hospedeiro e interação da ingestão de fibras nas bactérias intestinais alterando o metabolismo do triptofano.

Uma série de estudos tem relatado que a microbiota intestinal desempenha um papel fundamental nesse processo. ArAT é uma enzima que é filogeneticamente conservada em muitas espécies bacterianas, incluindo Lactobacilli e Clostridium sporogenes. Cinquenta e uma espécies de Bifidobacterium são relatadas para converter Trp em ILA. Outro grupo de probióticos Lactobacillus spp. converter Trp em ILA por uma desidrogenase de ácido indolelático (ILDH). Vários Peptostreptococcus spp. e Clostridium spp. promover a síntese de IA e IPA devido ao agrupamento de genes homólogos da fenillactato desidratase fldAIBC.

Trp→Indole-3-Acetato→Metilindol (Skatole) ou Via do Indole-3-Aldeído

O IAA (indole-3-acetato) é uma das moléculas de Trp degradadas por fungos e bactérias. O consumo excessivo de álcool exibe um nível crescente de IAM (indol-3 acetamina) aumentando o risco de câncer.

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/
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Metabolômica

O núcleo de nossas células contêm a molécula de DNA, que é transcrita em RNA e traduzida em proteínas que estão envolvidas na modulação de nosso metaboloma. Este é o dogma central da biologia, e uma compreensão abrangente desse processo representa a objetivo fundamental das tecnologias ômicas.

O metaboloma é o conjunto completo de substâncias químicas com moléculas pequenas encontradas numa célula, órgão ou organismo específico num determinado momento. O metaboloma pode mudar ao longo de um período de apenas alguns segundos ou minutos, como resultado de alterações no ambiente do organismo, ou após ingestão de alimentos ou alteração dos níveis de atividade. O termo metabolômica contém os radicais metabol (que vem de metabolismo, mudança, reações que acontecem a todo tempo no corpo) e ômica (ciência de precisão).

Assim, as tecnologias ou ciências ômicas são campos de estudo relativamente recentes e incluem a genômica, transcriptômica, proteômica e metabolômica. A genômica estuda o sequenciamento do DNA e a presença de mutações ou polimorfismos. Ajuda no diagnóstico e tratamento de erros inatos e doenças hereditárias. A transcriptômica (a análise de transcrições de RNA) complementa a genômica, permitindo-nos decifrar a expressão gênica, novamente ajudando a identificar casos não diagnosticados de doenças genéticas.

A proteômica (a análise abrangente das proteínas de um organismo) complementaria idealmente a genômica e a transcriptômica. Contudo, ainda existem avanços que precisam ser feitos nesta área para análise mais abrangente das proteínas produzidas no corpo. Por fim, a metabolômica busca identificar e quantificar o conjunto de metabólitos produzidos. Metabólitos são os produtos finais do metabolismo. Inclui a lipidômica (estudo de metabólitos produzidos a partir de lipídios) e a glicômica (metabólitos produzidos a partir de carboidratos).

Metabólitos endógenos e exógenos

Podemos estudar metabólitos produzidos pelo próprio organismo (como ácidos graxos, ácidos orgânicos, açúcares e vitaminas) e metabólitos externos ao organismo, derivados da metabolização de medicamentos e toxinas ambientais e aditivos alimentares.

Esses metabólitos refletem então a interação de nossos genes com o ambiente. Os metabólitos produzidos nos dão pistas para entender o fenótipo de cada pessoa. Assim, o genótipo indica predisposição o metaboloma indica o que está de fato acontecendo no momento.

Tipos de metabólitos

As substãncias produzidas desempenham várias funções no organismo. Podem ser combustíveis para vias biológicas, podem ser sinalizadores de vias, cofatores, estimuladores ou inibidores enzimáticos, moduladores de genes etc. Dependendo do que estamos tentando compreender podemos estudar:

  • Aminoácidos: fenilalanina, tirosina, BCAA, prolina, triptofano, quinurenina, citrulina, alanina, arginina etc

  • Ácidos nucleicos

  • Ácidos orgânicos (produção energética, ciclo do ácido cítrico): ácido cítrico, ácido cis-aconítico, ácido isocítrico, ácido alfa-cetoglutárico, ácido fumárico, ácido málico, ácido butírico etc.

  • Carboidratos: glicose, ácido pirúvico, ácido lático, ácido D-latico, alanina

  • Vitaminas: metilmalonato (B12)

  • Ácidos graxos: ácido adípico, ácido sebácico, ácido subérico, ácido pimélico, henanoiglicina, suberilglicina, 3-fenilpionilglicina, ácido etilmalônico, ácido 2-metilsuccínico, ômega-3, ácido linoleico, ácido linolênico, ácido araquidônico etc.

  • Peptídeos: glutamina, aspartame, carnosina, glutationa, glucagon, creatina etc.

  • Polifenóis: stilbenos, lignanas, isoflavonas, flavonols, flavanonas, antocianinas etc.

  • Minerais: cálcio, cromo, cobalto, ferro, cobre, lítio, manganês, potássio, selênio, vanádio, zinco etc.

  • Substâncias químicas ingeridas: chumbo, mercúrio, alumínio, antimônio, arsênico, cádmio, mercúrio, níquel etc

Estes metabólitos podem ser analisados no sangue, plasma, cabelo, nas fezes, fluido vaginal e na urina. A concentração de metabólitos é diferente em cada biofluido. É importante entender o que se quer avaliar, a condição do paciente e o melhor biofluido para análise. Existem marcadores funcionais para vários tipos de condições, incluindo:

  • Inadequações em micronutrientes

  • Disfunção mitocondrial

  • Insuficiência na produção de energia

  • Desequilíbrio hormonal

  • Exposição a toxinas ambientais

  • Atividade neuroendócrina

  • Supercrescimento bacteriano e fúngico

  • Impacto renal

  • Capacidade antioxidante

  • Metabolismo de macronutrientes

Dra. Andreia Torres é Nutricionista, especialista em nutrição clínica, esportiva e funcional, com mestrado em nutrição humana, doutorado em psicologia clínica e cultura/ensino na saúde, pós-doutorado em saúde coletiva. Também possui formações no Brasil e nos Estados Unidos em práticas integrativas em saúde. Para contratar envie uma mensagem: http://andreiatorres.com/consultoria/
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